sexta-feira, junho 27, 2008

Carcereira

Morre tu, vã Paixão!
Que nos torna pequenos
em nossa prisão de sentimentos.
Egoístas solitários!
Vemos apenas o desejado.
Cegos compulsivos!
Não vemos sequer o mundo.

Não és tão grande quanto imaginas:
se nos destróis em tua ira,
morres em tua solidão!
Mas, de toda teimosa
Sustentas nossas asas de Ícarus.

E há o dia em que derreterás
com nossas asas
tão efêmeras quanto a argila.
A realidade queima à verdade,
e o mundo que não víamos...
desmorona.

terça-feira, junho 24, 2008

Entendimentos

Eu penso no homem, porém não o vejo.
O entendo, mas não o sinto.
Sou cega
Sou surda
Muda
Da alma que mais entendo
Dos olhos que mais me dizem
Fechados
Fugidos de mim

Como posso me ser o real?
Se na minha confusão ilusória, perco meus freios?
Explosão!
Provoco o turbilhão das faces, minhas caretas.

Somente para confundir teu olhar
Para não me veres jamais
Para que não me entendas
Para que não veja além do espelho,
superfície de meu profundo lago.

Homem amado meu
Passado meu
Futuro meu
Humanidade
Menos humana de meu sangue
Lê os meus sonhos?
Os meus lábios?
Enxerga os meus olhos?
Como podes, então, não ver o meu olhar?

Posso acabrunhar minha mente.
Isolar meus desejos
Fingir-me una
Mostrar-me muitas
E, no entanto, todas suas.
Rivais e amantes

Pesadelo
Sonho
Paixão

Temem estes todos?
Eu já não.

quarta-feira, junho 18, 2008

Roda Cutia

nem todo dia decora-se a arenga
austera verborragia de poeta molenga

pois bem, entoarei cantoria indígena
ao meio-dia, nesta ermida
prosa alquebrada, toda malfeita
atroz frenesi com iguaria suspeita

imagens de arcanjos desconexos
promovem bacanais nesta capela prístina
e os ébrios comandam o ritmo
dançam e giram em um só pé
com selvageria de um só pã

anjos e demônios sibilam nas pautas
que transcrevem valsas homéricas
e a siringe causa flutuar
toda a súcia que parasita as épocas

eis que chega aquela freira cética
toda faceira em moda de buda
todos os mantras da ayurvédica
ela tira no saltério, delírio da platéia

eis que chega Grandão-Mor, convidado de luxo
é sapiente, vossa onisciência máxima
não resiste à música, e entra na dança
e toma a mão da freira, ao amor se lança

aquele ateu vizinho, mal humorado
convida a polícia fazer parte da festa
eles expulsos da Igrejinha; acabou-se a dança
desligou-se a música, apagaram-se as luzes.

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uma das parlendas que eu mais me lembro de quando era criança era a Roda Cutia.

Roda Cutia, de noite e de dia, O galo cantou e a casa caiu.

segunda-feira, junho 16, 2008

Relâmpago

Uma súbita inspiração e um romance perdido
um
conto
falido
É tão rápido
como palavra mágica
costumo dizer
sou tudo
em intensidade
Sou divindade
Procuro
estar mais perto
o que é?
vislumbro.

Acontece

Acontece o que sempre acontece
Aconteceu aqui, aconteceu lá.
Acontece tudo
Em toda a parte
Eu não percebo
Mas lhe contaram
Acho que sou surdo
Não me acontece, mas aconteço.

Acontece, e se resume a isso?
Uma eterna inquietude?

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Acontece aqui, acontece lá
Acontece tudo
Em toda a parte
Eu não me dou conta
Estou surdo

A vida se resume a isso
Uma eterna inquietação.

Mãe

Parte I – Exaltação e Depressão


Ah sim!

Acordo leve após vinte anos

Seguro e confortável, após acordar-me.

Uma gostosa conversa de vinte anos

Atrás.

Em cantigas de ninar

Vinte anos eu mergulhava

A densa vastidão da humanidade

Curiosos mistérios inefáveis,

Infantis, bolas de gude.

Hoje,

Não ouço mais cantigas pra embalar

E nem verto mais lágrimas,

se as vertesse, as ferveria para um bom chá.

E cantaria:

"-Aqui jaz um espectro de poeta,

Um pesado perdedor sem vínculos.

As dúvidas existenciais me deixam louco;

São como uma nuvem de mosquitos – e tento de espantá-los

E nessa nuvem

existe uma fada que carrega um pote, de voz bem doce

Que cantava algo assim:

algodão-doce, caramelo! marmelo!"


Parte II – Aos Pais – Dor e Expiação


Há vinte anos disserdes-me:

Obedeça.

Desobedeci.

Arrependi-me.

Prometo que vos amarei

Na distância, ternura e amargura,

Sempre.

Prometo que vos honrarei

No Céu e na Terra

e que vos obedecerei

Em júbilo e contrariedade

Nunca é tarde.

Vosso eterno devedor suplica

A minha angústia leva embora

nas horas de apatia

Não quero cair em desordem

Nem em rebeldia

Fui por vezes muito ingrato

Mas sempre vos amei

E se necessário for

Morrerei por vós

Pais da Terra,

Obrigado.


Parte III – Mãe.


Nos devaneios mais sombrios

Afugentando os mosquitos

Para longe do meu coração

em dúvidas

Encontrei-te

Estava atormentado, ansioso, aflito

Deste-me de beber, pois estava com muita sede.

E prostrei-me, como nunca antes.

Mãe, manhã de orvalho.

Sou teu bebê que ainda balbucia no berço

Sou tua luz tão forte que me aquece!

sábado, junho 14, 2008

Amandinha Vomita

Qual escravo obediente padece;

Seca, débil, abatida, raquítica,
Pele, osso, desfigura fodida
Segue Amandinha, afoita e faminta,
Tirando de sob a cama a comida,
Seu voraz, incontrolável instinto:
Come, devora, orgasma a papila

Degusta coa língua prazer negado,
Júbilo que a caloria reclama,
Felicidade que o espelho rouba,
Contentamento que a balança afana

Mas, passado curtíssimo flagrante,
Qual centelha que de queimada cessa,
O devaneio e o riso, num instante,
Se fazem pranto, se fazem promessa

De que aquela aventura proibida,
Gustativa, obscena, pecaminosa,
Jamais seria, jura, repetida.

É com vagar de ré que se levanta e,
Tal como humílima escrava, que é
Oferece à balança, ao espelho
‒ Senhores do engenho do corpo ‒,
O sacrifício que já lhe é velho:

Força contra a goela dedos-ossos,
Engasga e descarta, com bolos grossos
De alimento, doses diárias de
Seu sorriso, sua alma, sua vida.

segunda-feira, junho 09, 2008

guerra fria


você fica feliz quando seus filhos voltam da escola ?
você sofre nas longas noites longe de sua família ?
você conta cada segundo do seu trabalho até poder voltar pra casa e ver os entes que tanto ama ?
você dá beijo de boa noite nos seus filhos ante deles dormirem ?
você regozija ao ver suas crianças brincando sorridentes por ai ?
você se sente o homem mais feliz da face da terra quando vê a sua amada ?
você já sentiu o imenso prazer que é passar um domigo de sol em casa com a familia ?
você ama sua mãe ?
então não aperte este botão

Louco é

Louco é louco, louco é mouro, solto, roto, rato, todo o sacro, saco de pancadas.
Fraco é sempre louco, rouco está meu pescoço, o forte de todo louco.
Todo maluco é querer ser enorme, disforme, diferente.

Todo idiota quer um agiota que lhe roube o fundo,
O fundo do seu mundo.

Fraco é sempre louco porque louco é sempre um marco,
Cansa o imóvel, insensível corpo.

"Dizem que sou louco por pensar assim.
Se eu sou muito louco por eu ser feliz,
Mas louco é quem me diz.
E não é feliz, não é feliz."
Balada de Louco, Os Mutantes, na voz de Sérgio Dias.

sábado, junho 07, 2008

Escrever minimamente sobre o contexto que pouco refresca

Escrevo pouco,
Sou o refresco.

Escrevo mínimo,
Sou o contexto.

Mínimo refresco e
Pouco contexto.

sexta-feira, junho 06, 2008

Versos à solta!

Procura-se versos fugitivos
Estrofados, escansionados, livres, de qualquer jeito
Recompensa: R$POESIA,00

Família Real

A mesa toda cheia
De comida e cadeiras apenas
Todos vêem a janta
Na real novela

Todos estão na televisão
E a família jaz
Na mesa virtual

Só vêem o que está longe
E sentem o sofá próximo

Jaz a família virtual
www.estr3lad4lvadesponta.com.br

até a vios

Invenção Psicomorfotrópica de Mulher

Estive enferma por dois flebótomos
Que mistificaram minhas pernas
Construíram varizes, fístulas hilárias
Contrataram horrores divinas filárias

E pulsava a vulva vívida,
depreciativa luva bífida
Incidindo seus filetes suprarenais
Adjacência de corticóides
E eu com um asco estranho
Mas que vontade de lamber!

Que jovem fartura, desfigurada
Balançando ávida na maca
exibindo as hemorróidas
carcinomas uterinos, sarcomas da endocérvice
cistos ovarianos, líquen labial
numa posição vil à la papanicolaou

Sou a Deusa do Abscesso
vulvovaginite em excesso
e tudo o que preciso ó Doutor
são dois comprimidos pra dor.

quinta-feira, junho 05, 2008

Aquilae Volant

o esplendor de suas envergaduras
ofuscam-me os olhos
quuando os volto para o céu
observando os grandes borrões
majestosos

voem reis predadores
voltem para seus ninhos
com alimento ao dispor

voem aves magnânimas
carregando proeza em seus bicos
incautas
serão depenadas (?)

"post nubila, iternum"

quarta-feira, junho 04, 2008

Informação

Sabia que