terça-feira, novembro 27, 2007

Voz

Um homem pegou o microfone,
Atraiu as atenções insones,
Os olhos insossos de uma geração
Sem nenhum rosto, sem nenhuma
Frase de efeito, só robôs sem nome.

Cantou uma canção que não era nem
Apocalíptica, nem angelical ou ideal
Para festas daquele tipo, era um réquiem
Ateu para seu próprio espírito,
Era um suspiro, um soluço
Dos traumas que o circunscreveram
Por toda sua vida.

Um homem pegou um microfone,
Tinha a voz metálica de um distúrbio
Avançado, de um martírio acuado.

Sua voz de máquina estava recitando
Poesia aberta, tal como o sangue
Respingando em sua saliva,
O excitante sofrimento interno.

Não se ouviu guitarra
E nem piano, naquela noite,
Só uma voz rasgada
De quem perdeu sua própria
Morte.

O muro

O muro estava lá.
Surgiu sem alvoroço
sem ser requisitado
sem sequer avisar.
Foi construído à noite,
soturno, sem testemunhas.
No dia seguinte
ninguém notou.
Para todos
o muro sempre esteve lá.

II

“Não pule o muro” diz a placa.
“O muro é para sua segurança” diz a lei.
O muro é só mais uma barreira,
nos diz o espírito.
Separando, dicotomizando,
privatizando o que devia
ser de nós todos.

III

Separa-se o corpo,
talvez até a mente,
mas a alma, a alma é superior.
O que é um muro
frente aos leões do dia,
aos venenos da noite?
O que é um muro
para alguém com
asfalto debaixo das unhas,
fuligem correndo nas veias?
Para quem aprendeu
a contar com os centavos
e a ler com os cartazes?
O muro é só argamassa,
a alma é algo mais.

segunda-feira, novembro 26, 2007

Ritmas do Artista

Eu, ser volúvel que brinca com rima
Um tanto escrachado ajeitei minha postura
Para debilmente aspirar aos poetas de cima
Magnetizei o monitor com tão pungente candura.

Minha rima pode ser áspera
Contudo carrega consigo a riqueza
Com tamanha beleza que acode na véspera
Da ocasião que sempre mantive a poesia acesa.

Meu ritmo também pode ser de pobre
Sendo escuro e bruto, puro chumbo
Aos meus olhos porém, será como cobre
Material travesso que ilumina o mundo.

Minha poesia é tal qual Grande Águia
Austero símbolo de liberdade
Para mim, madame,
A métrica não é toda verdade.

Contato amoroso ou O surto

Alô? Olá!

Francine, diga para minha namorada que, mesmo ocupado com toda essa papelada, com a minha mente insaciável, com minhas mãos trêmulas e distantes, que meu espírito está sempre com ela. Estamos juntos não por causa das metades das laranjas, mas por conta dos grãos de nossos seres, das migalhas que nos deixam malucos. Não desligue, Francine. Não, eu ainda não acabei. Diga a ela, desculpe ser chato, que eu não penso nela todas às vezes, mas toda a vez que eu movo minhas inspirações, até quando estou na companhia de outras mulheres, sinto a voz dela na minha, integralmente. Não somos um, somos mais do que isso. Somos compartilhados, somos simbiontes, somos o microcosmo de um macrocosmo que todo mundo esquece, que todo mundo apazigua. Nunca fui defensor de monogamia, mas com ela vale a pena. Valeria a pena ser celibatário só pelo sorriso dela, mesmo cuidando de mim, mesmo pensando no meu próprio ego. Valeria viver cinco mil vidas porque vi uma que é especial. Descobriria outras especiais com ela, pode falar isso. Eu não morreria por ela, mas ela encanta minha vida. Com o amor dela, vejo até simpatia nas suas palavras, Francine. Mesmo que você se emburre com meus devaneios, quero que saiba que te amo também. Fale para ela que, além de amá-la, eu tenho vontade de me alojar nos atos dela, de transmitir a herança que filho nenhum pode me dar. Não há satisfação melhor que essa.

Durma bem, Fran. Obrigado por me ouvir. Vou voltar para o escritório, beijos.

Cansa-Aço

É...
Todos, como humanos de ferro que somos
Liga de ferro e carbono que forma nossos gélidos corações
O anseio elétrico que compõe a nossa alma
Os versos bárbaros prosaicos que tecem apenas uma confissão
E o nada escrito mostrando mais do que um verso sem razão

Mesmo compostos de ferro, nos cansamos
Nos cansamos de acordar
Nos cansamos de dormir
Nos cansamos de respirar
De ir, de vir, de chegar, de esperar...
Nos cansamos até de nos cansarmos!

A eterna máquina humana que nem em sonho descansa
Mas nos sonhos mais se cansa do que fica resguardada
Como os longos versos de textos futuristas
Tão cultistas do metal que esqueceram
Do aço que corre por suas veias
Afinal, as hemácias não contêm o ferro e o carbono?

Nos cansamos! Nossa energia potencial transforma-se em calor
Mas não o calor humano que aquece nossos corações com sangue borbulhante
Mas o calor dissipado que torna exotérmica a nossa alma!
O champagne estoura mostrando o progresso!

O mundo veloz, atroz que persegue! Com seu aço, sua doutrinação e sua tecnologia...
Até onde?

Uma poesia para uma prostituta

Segue, abaixo, versos, pedaços de frases completas,
Das linhas diversas que percorrem o meu consciente
Produzindo impulsos líquidos, elétricos, fluídos em
Circuito, do sistema de contatos, do observador de
Mundos, do mudo processo de relato, contrato.

Um pedaço pautado, escrito e rabiscado
Relata meus sentimentos pessoais para você,
Intercalando racionalidade e abstração, estou absorto
Para lhe contar minhas leituras, a partitura
Que talvez te irrite, como todas as outras.

Você não é culpada por vender seu corpo,
Nem por aproveitar os divertimentos, celebrar
O descontentamento de meus companheiros,
A ausência de suas esposas,
Na verdade, acho que não é isso que você
Faz, acho que o que te retrai é a sua falta de
Profundidade, alguém que ame a promiscuidade
Seria mais feliz.

Você não é culpada por vender seu corpo
Em um mercado de moldes, em uma caixa
De brinquedo, um envelope de correio.
Você não é bastarda por abrigar parceiros
Sexuais por muito tempo, mas solta gemidos e choro
No relento do seu pequeno enterro.

O mercado, a venda de suas peças,
Não me comove e nem me escandaliza,
Eu não sou mais jogador moralista.

Não sou teu inimigo, talvez
Seja seu amigo, embora seja minha vez
De te colocar de castigo, punir seus paradoxos
Porque eles não são naturais, são ortodoxos.

Prostitutas, mulheres ou homens,
Não esperam o cliente na porta do cabaré,
Prostitutas não balançam bolsas, não são
Tão trouxas, nem chegam perto da Roxane
De Sting, a moça que suja, sem dar vexame.

Prostitutas habitam corações comuns
Que elevam o exibicionismo em níveis absurdos
E calam seus raciocínios mais astutos.
Se fecham em corpos, se viciam em alienações,
Devoram o cigarro da auto-corrução.

A prostituta desabrocha no seu coração, minha amiga,
Amarga suas relações, apodrece suas convicções, está sempre aliada
Nas mais contraditórias das paixões, o ódio que te torna inócua,
Evacua suas reservas, são resíduos das suas táticas perversas.

O verso tece os contornos de seu corpo
E ele não está se exibindo num desnudo encontro,
Está acuado em um quarto escuro, chorando todas as
Coisas que tua cabeça torta não confia.

quinta-feira, novembro 22, 2007

infofadiga e eletrosaturação



estou cansado
cansei dessa onda de informação
cansei do conhecimento ao alcance dos meus dedos
cansei de ver muito e notar pouco
cansei da distância entre as pessoas
cansei de palavras sem voz frases sem emoção e emoções sem expressão
cansei de informações sem sentimentos
agradecimentos por nada
sarcasmos invisiveis
questões sem resposta
e respostas sobre nada



quero mais vozes sem palavras
emoções sem frases
sentimentos sem informação
contato humano
silêncios confortáveis
calor
amor
pavor
e odor(seja qual for)

quinta-feira, novembro 08, 2007

Viuvez

Não me lembro do momento certo em que me apercebi sem a possibilidade da sua presença; me veio aos poucos, ou eu o soube e o bloqueei de mim: fiz de esperançosa, fiz-me desangústia. Mas esta me surgiu, na data incerta que o meu apagar não deixou ser súbita; eu não queria acontecimentos. O seu espaço está desocupado em meu ventre - é o agora e é só e enerva - como se a raiz empurrasse angústia e cimento para alcançar e continuar a ser. Aqui tem as representações suas, os números e as letras: provam que você houve e não servem de nada - rabiscos de um só na caverna, ficam no tempo futuro se o presente deles esquece. Eu não vejo as letras nem os números; apenas, quando os invoco, sinto seu joelho no meu e amo sorrindo a angúsita de não amá-lo de perto.

Quando eu morrer

Quando eu morrer, que me queimem
Ninguém vai ganhar dinheiro vendendo caixão
Ou pedaço de terra em cemitério.
Também não comprem velas
Ou gastem lágrimas
Pois nada me traz de volta.

Que doem meus pertences
Tudo aquilo que consegui trabalhando
Ou o que ganhei em meus aniversários.

Mas rasguem as fotos e queimem as roupas
Destruam os vídeos
Apaguem os registros
Que não sobre cheiro, nem gosto
Nem imagem, nem som
Do que um dia eu fui

Porque quando eu morrer
Eu quero ir decerto
Nada mas me ligará a este mundo.
Que não chorem os pais que se foram
Os amigos também já mortos
A mulher que não tive
E o filho que eu nunca criei

Quero apenas estar vagando junto ao vento
E cada pedaço voará para um canto
Tocará uma casa, uma árvore, uma pessoa
E eu estarei em todo lugar
Serei parte do mundo que me abrigou
E do qual eu fugi
Para sempre

domingo, novembro 04, 2007

Ir e voltar - A ressaca

O velho Machado relatou bem,
Capitu me fazia dar voltas em círculos,
O velho falou tanto, lembrou o quanto
Nossas ações são vagas, cúmulos.

As voltas dos olhos negros,
Das ondas lentas, do mar sem medo,
São como contrações do sexo, sem nexo.

O gozo derruba minha parceira,
Com ela sinto afeição, dou uma piscadela
Certeira, estou satisfeito. Alimentado?

Beijo-lhe os lábios e meus sentimentos vão, como lacaios,
Para a taverna dos meus falsos rostos, faço cara de quem
Fez amor e estava mais interessado em cem prazeres.

Ela acua, pensa que não me machuca
Com seu olhar amedrontado, acha que foi usada,
Colocada em venda, sem remenda.

Chora, meu amor agora chora, hora
Da minha mudança de atitude,
Falsos moralismos onde a culpa
Não foi minha, nem tinha como.

E acabamos de novo na cama, nas ondas
Que não sei dizer se é do mar ou rio, obras
Do engenhoso ou do manhoso
Dia que me aguarda, trabalho.

Acabamos mortos na cama, com a minha cara solúvel,
Molhada, substituída.

E ela volta a tremer de medo. É o indiferente.

Inconsistente é a ressaca,
Que sem sistema, caça
As feridas e as mordaças.

sábado, novembro 03, 2007

Piano, solidão e felicidade

Contarei uma estória simples, um trecho limpo,
De natureza ampla, num ponto efêmero.

As teclas desciam e subiam num ritmo apetitoso,
Notas subiam até a imagem do cérebro, vagarosas,
Era um menino com menos de dez, tocando
No âmago dos cinqüenta anos.

Essas teclas só subiram agora, ele passou as mãos no rosto esguio,
Em seus olhos verdes cor de água, em seu pensamento muito valente,
Potente em sua criatividade, delicado como sua intimidade, sua timidez
Exposta, procurava nem sair de casa, nem sair de sua própria cabeça.

Passou outras vezes a mão pelo seu companheiro enorme e negro,
Cujas cordas silenciosas povoavam seus sonhos, seu desejo
De se ver tocando num palco, sem medos ou desesperos.

No entanto, nunca passou do estado de tocar a si mesmo,
Tocar uma música para si e sentir, no bruto, as sensações etílicas,
Tocou a si e se tornou diferente de todos, num esforço a esmo.

Sentia-se sozinho,
Sentia-se abandonado até quando tocava o piano,
Sentia-se sozinho e abandonado com seu piano.

Teclas descendo, mas era feliz, era assim, como uma atriz
Que recita um canto melancólico, mas que se enriquece
Com o doente, com a arte entre a gente, sensível quis
Que o mundo inteiro chorasse como ele faz, todo dia.

Lágrimas e teclas,
Dos humanos, talvez um dos mais vividos deles,
Nunca teve uma garota, um orgasmo real, um reles prazer
Corporal,
Teve sua música, suas lições e emoções, encontrou
Seu próprio fazer analítico, metódico e poético.

Lágrimas e teclas,
Não sinta dó de quem chora,
Nem de quem parece eternamente só,
Que cora poucas vezes.

Lágrimas e teclas,
Não procure sentir tudo o que o pianista
Expressa, procura na tua alma
A tua melancolia secreta.

Lobos

À Carol

Canis lupus.
Animal. Mamífero, carnívoro
voraz. Vive em bandos. Macho
alfa domina alcatéia
(alcatéia!) uivando
muito! muito! muito!
Os mais fortes na Avant-garde.
Prole boa:
Macho forte Fêmea forte.
Bicho bravo.

(e caras-de-pau dizem que Homem é o bicho mais esperto)

25/08/2007

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Originalmente postado no deviantArt, aqui.

Comentários apreciados.

quinta-feira, novembro 01, 2007

a verdade


sou honesto, franco, e não faço eufemismos, porque eu vim para esse mundo para mostrar como, por mais que seja cruel e afiada, a verdade é maravilhosa por si só e como ela é, nua, crua, fria e pulsante.


(não sei se este é um texto que sirva pro blog, visto que ele é apenas uma frase, mas quando vi, já estava postando)

segunda-feira, outubro 29, 2007

Brincadeira de boneca

Era uma garota sempre atarefada,
Estava rodeada de pessoas, abafada
Pelo uníssono da multidão, abraçava
Muitas figuras, era sempre muito quista,
Muito mista, carregava muitas listras na bolsa.

Mostrava fotos de auto-promoção,
Fazia elogios para graduação em relacionamentos,
Era um tormento quando falava, ao som de fundo
Das bijuterias que chacoalhavam ritmadas, incômodo.

Tinha o melhor namorado,
A melhor morada de idéias
Junto com a melhor roupa,
Era uma imagem alheia,
Inerte, areia de um deserto.

Tinha os melhores momentos
Memorizados num relento
Impuro, num saudosismo fajuto.

Era dona do melhor beijo,
O eixo de sua comprovação barata,
Era uma caipira no sentimento, uma lorota
Em procedimentos mais profundos.

Adormecia pensando que a vida era uma fantasia,
Mas não esquecia suas doses diárias de cocaína,
Uma bituca no cigarro e um mergulho na caipirinha.

Adormecia pensando que a vida era uma fantasia,
Quando queria mais é tornar os fatos artificiais,
Os sentimentos anormais, necessidades mais canibais,
E devorar a virtude companheira sem mastigar.

Era um rostinho lindo, redondo e coberto por mechas loiras,
Talvez fosse uma morena esbelta, uma modelo dos açoites
Internos, que são gerados nesses regimes loucos.

Era um rostinho lindo e trágico,
Uma brincadeira de boneca
Com um projetor rolando cenas
De filme de princesa, hábito
De ditadora, perfume de moleca.

sexta-feira, outubro 26, 2007

Inutilia


Minha cabeça é um amontoado de amontoados.

Bagunça pessoal, interna. A pseudo-cultura me (nos) derrota;
versos queimados em fogueiras-imitação-de-cultura;
lampejos geniais tornados ridículos;
criação impedida por incapazes de idéias
efêmeras: invocadores cotidianos do luxo
mais-que-importante, necessário (imbecilidade
engarrafada), vendido. Mentido
tem aqueles banais consumidores do ócio:
ridicularização do conteúdo invulgar;
metafísica dos lançamentos,
porvorosas épocas inúteis:
natais! anos novos! páscoas!
Antínoos clonados, rebanho
midiático, rapsodos dos modismos!

Vinde a mim os fúteis, diz o Messias do Século XXI.

25/10/2007


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Originalmente criado para publicar-se na comunidade "poesiaPT" do deviantArt, cujo tema deste mês é "Vazio".

quinta-feira, outubro 25, 2007

Está Tudo Bem

Esta roupa, este ar, este tempo já não cabem em mim. Talvez tenha engordado, as narinas tenham se fechado, ou foi o tempo que passou. Ou uma angústia daquelas, da meia-idade, tenha finalmente aparecido pra me instigar arrependimentos, a pensar ‘se...’, ‘se não...’. É o típico momento de recapitulação, que acaba uma capitulação pela impossibilidade de voltar. Cada mulher, poucas, relembro, despedaçadas; a boca e os seios de Luciana, a cicatriz nas costas de Bruna, as pernas loucas de Letícia, o cérebro e o gosto de Julia, de quem ficou a amizade. Só não recorto Madalena, essa vejo toda, porque todo tempo a vejo. Aqui e ali, no quarto, levando o Murilinho pra escola, me beijando em selo a boca antes de saírmos e nos separarmos; depois, à noite, no reencontro. Vamos nos acostumando e criando rotinas com as pessoas, como foi conosco. Hoje eu não poderia olhá-la e gritar, gritar e abraçá-la bem forte como às vezes penso em fazer. São códigos. Fazemos, enfim, passam; está tudo bem, fizemos. Mas agora o desejo de quebrá-los todos me vem mais e mais forte. Chego a imaginar com ardor uma frase absurda em cima da cama, de pé, dita a ela num assomo de lucidez. Não poderia dizer depois: Amor, desculpa, foi loucura – tinha de ser a sério, como a vontade se me anuncia. De sopetão, quebrar a hora, o bom-dia. A cara de Madalena estampada no rosto , aquela de mulher que faz acontecer. Quantas vezes não penso em dizer, Puta!, Maldita!, Piranha!, aos berros, sacudi-la e ver o que sucede. Dizer palavras insensatas, impuras, e mordê-la na boca como nos inícios dos nossos namoros no banco de trás do carro. Mas é ela ali, a mulher que pariu, que escolheu o carpete e minhas camisas; que fez o jantar e se lavou depois do sexo; que me fez sentir dispensável, mas não completamente; que cuidou da casa, dos filhos, do trabalho e continuava se desvelando por nós, pela família! Família esta que era e é minha nova identidade. Como eu, em um egoísmo absurdo, poderia quebrar esse elo todo estável, de palavras e ações em rede, interdependentes e dosadas de certas emoções certas? Quando ela chegou ao quarto, eu deitado na cama com os olhos hipnotizados na imitação de um Dalí na parede:
-Oi, amor. – me beijou – Que foi? Tudo bem?
-Nada não. Tá tudo bem.

segunda-feira, outubro 22, 2007

Verbonominal Transgressão

Transgrido, transgressiono o algoz
Aquele que me pressiona me impressiona
Com sua altiva capacidade de convencer

Convencer-me a tentar corretamente escrever
O atroz idioma...
Que a verbos flexiona e me curva
Minha visão de criativez turva
E eu transgrido ele! Ah se ele transgrido sim!

Rompo! O desmantelo! Apresento-lhe seu descalabro!
Sua ruína!
Fascina até o facínora que escreve
Que se atreve a desafiar, desafinar
Toda a consonância léxica

Apegando-se aos valores semânticos de composições e derivações impróprias
Mas o que são derivadas senão meras funções?

Funções! Sintáticas, escalafobéticas, matemáticas!
Mate! Má! Ticar!

Escalofobia! Medo! De escalas, escadas, fobia, pavor...
Devaneios de uma alínea e linear linha de luci... dez?
Que luz nas trevas de pensamentos?
Que luz na escuridão do tormento de não saber?

Escrever? Não mais direitamente.
Para que penetrar surdamente se o silêncio estraga a diversão?...

Infrinjo! Gasto meu célebre cérebro, célere também!
Como uma onda, vai, vem...
Como na estação um trem. Outrém...

Para que não usar-se de digressões
Agressões à coesão! À coalizão, máfia do idioma
Indústria que julga a cultura; juga...

Para eles, o real
Idioma é cutura
CU tura
Cobretura
Cobertura
Fachada
Farsa
Falso
Fosso.

terça-feira, outubro 16, 2007

Apenas mais um

Sou um homem médio
De estatura média,
compleição média, classe média,
capacidade média, inteligência média
medida pela sociedade média padrão.

Vivo no meio do caminho,
sou um arauto do quase.
Tenho uma quase namorada, que quase me ama.
Tenho quase amigos que quase se importam comigo.
E quase sempre tento manter as coisas em ordem,
embora quase sempre não consiga.
Eu quase consigo amar.

Sou homem comum,
Daqueles que passam despercebidos na multidão,
às vezes até mesmo quando sozinho.
Minha família não me ama, gosta.
Meus conhecidos não me gostam, simpatizam.
Meus inimigos não me odeiam, desprezam.
Também não me arrisco em aventuras desenfreadas
nem desfruto da tranqüilidade dos pacatos.

Cristo, que vida inútil!
Vida que não é vida nem morte,
vida que não consegue sequer ser não-vida.
vida insensível, invariável,
vida matando vida, matando tempo,
apenas esperando seu enterro passar.

segunda-feira, outubro 15, 2007

Júlia

Ela é muito feminina. Júlia. Perfeita. Sublime. Uma musa.
Desperta os sentimentos mais profundos e sinceros de todo homem que a avista, sem falar dos desejos lascivos.

Lábios perfeitos. Só de imaginar seu beijo em minha face imberbe, tenra e quase imatura, surgem em mim efeitos fascinantes. Creio que já gastei incontáveis horas no banheiro por causa dessa mulher. Ah, Júlia, que mulher.

Um adjetivo? Tesuda. Antes vulgar do que insincero. Tais curvilineidades provocam cócegas de prazer. No íntimo das mentes masculinas (e lésbicas, bem provável).

Lábios perfeitos. Júlia. Quero adoçar minha boca com a sua. Exalto-a, tão perfeita quanto a sua pessoa. E que língua, deveras graciosa! Pedaço de paraíso. Sua língua, cuidadosamente comedida!

Julia II

Na poesia encontro a ti, Musa

Júlia, passional, destrói qualquer
Amor conjugal

Insinuante, que delícia humana.
Traz à tona escolhas aviltantes.

De baixa estatura, precisamente formosura
Delicada, incomparável deusa
Imoral, Dama do Mal
Faz de tudo para obter prazer

Lábios Perfeitos, Júlia
Mostre-nos suas pernas, nuas
Perfeitas para enterrar em jugulares.